Uma varredura foi feita no céu, eliminaram-se nuvens, limpou-se o terreno. Não havia mais nada por perto, apenas pessoas e paisagens. A criatura visualizou o ápice da caixa do mundo: o manto inalcançável. Uma venda amarrou-se aos seus olhos, carregada pelo vento. A escuridão tomou-a, mas uma escuridão anil, o mais puro azul que constitui as cores primárias.
O azul sem nuvens que obscurece a imaginação.
A criatura foi presa em seu subconsciente, desesperada para saber o que ocorria ao seu redor, regurgitada da realidade. Criando situações, criando gráficos ao seu entorno.
Subitamente raízes rasgaram o chão chicoteando a pele exposta da criatura. Soltaram-se as estruturas, desconstruiu-se as certezas. A criatura permaneceu vagando em seu abismo azul. O mundo decompunha-se em excrementos. Larvas de ureia expeliam seres encefálicos com corações de nitrato, pensamentos de restos.
Puseram-na em um pau-de-arara sem que tocasse no habitat ignóbil. Pensou estar circundada pela vida, mas era a morte que rondava sua existência. Pensou em mudança, perguntou e não escutou a resposta.
O som perdeu-se ao mergulhar no vácuo.
Esmagaram-lhe a face, trucidaram sua garganta. Respirava e emitia sons como um invertebrado. Derretia-se aos avessos, não encontrando sua natureza; fugindo dela.
Escorria pelo casco como vômito, ou como veneno - corroendo os sentimentos.
Perdeu-se na solidão daquele mundo desgastado (tanto quanto a criatura). Os olhos enxergavam apenas uma imagem, um destino. As vendas nunca caíram-lhe da face e permaneceu, a criatura, espalhada ao chão, seus fluidos evaporando.
A criatura ligou-se à terra, acomodou-se a ela, virou mesmo elemento.
Transformou-se em uma criatura coprófila.
Apenas criatura.
Um comentário:
Ficou sensacional, me pergunto como consegues expressar-se tão profundamente, não tenho tal habilidade ou diria dom. Estou muito curioso para saber qual o próximo.
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